Em entrevista à BBC Brasil, Grangeiro disse que o Brasil gastou cerca de R$ 6 mil por paciente beneficiado pelo programa em 2005, valor que, segundo ele, só poderá ser mantido às custas de outros programas de Saúde.
“Manter a atual política de anti-retrovirais significa comprometer os tratamentos de outros programas (do Ministério da Saúde), o que já aconteceu em 2005”, disse o especialista, que esteve à frente do programa nacional de combate à doença.
O Brasil é elogiado em um relatório do Unaids (programa da ONU para a Aids) divulgado nesta terça-feira.
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Grangeiro baseia a sua conclusão em um estudo assinado por ele e outros especialistas, incluindo outro ex-diretor do programa brasileiro para a Aids, Paulo Teixeira, em que analisaram a resposta nacional à doença entre os anos de 2001 e 2005.
Já publicado na Revista de Saúde Pública, o estudo será discutido na Conferência sobre a Aids que começa nesta quarta-feira em Nova York, e deverá servir de base a uma das proposições da declaração final do evento.
“A tendência de aumento da proporção do PIB e das despesas federais com saúde destinadas à aquisição de anti-retrovirais demonstra que a sustentabilidade da política de acesso aos medicamentos será garantida apenas se o país crescer a uma taxa anual de 6%, cenário que se mostra pouco provável”, diz o artigo.
Os cenários traçados pelos especialistas foram baseados em estimativas de crescimento de 2% a 4%.
Segundo Grangeiro, se decidir não comprometer o orçamento da Saúde em detrimento de outras doenças, o Brasil vai ter que escolher entre diminuir a qualidade do tratamento atualmente dispensado aos soropositivos – com remédios que garantem menor sobrevida, por exemplo – ou atacar as causas do aumento dos preços dos remédios.
Embora ressalte que o custo vem aumentando também por causa do maior número de pessoas em tratamento, Grangeiro avalia que o aumento se deve ao principalmente ao descrédito da indústria nacional de genéricos, que deixou de fabricar medicamentos importantes e deixou de ser uma ameaça para os grandes laboratórios em relação à quebra de patentes.
“Até 2003, havia a percepção de que a indústria (pública) nacional tinha capacidade técnica de produzir drogas patenteadas. Desde 2004, a indústria nacional está desacreditada”, afirma Grangeiro.
Para o especialista, o descrédito é “gerencial e político”, já que os laboratórios públicos têm capacidade técnica para fabricar “qualquer medicamento”.
Ele argumenta que a quebra da patente é a medida de última instância, mas a fabricação dos genéricos é um instrumento importante não só para o avanço da pesquisa científica como para aumentar o poder de negociação do governo brasileiro junto aos laboratórios.
Segundo Grangeiro, existe uma expectativa de órgãos ligados ao combate à Aids de que o Brasil quebra uma patente e reassuma a liderança na questão. “Existe até uma frustração internacional de que o Brasil ainda não tenha quebrado uma patente”.
O Brasil ameaçou quebrar patentes de medicamentos anti-terovirais em diversas situações, mas acabou chegando a um acordo com os laboratórios detentores em todos os casos.
A quebra da patente é considerada legal em situações de emergência de saúde pública.
Embora avalie que o encarecimento do programa brasileiro põe em risco os bons resultados atingidos, Grangeiro compartilha da avaliação positiva feita no relatório da Unaids divulgado nesta terça-feira.
“A resposta do Brasil à Aids continua a ser louvável. A prevalência nacional do HIV era 0,5% em 2005, infecções de HIV relacionadas ao uso injetável de droga estão em queda em diversas cidades e o acesso ao tratamento é amplamente difundido. Cerca de 170 mil dos 209 mil brasileiros precisando de terapia retroviral estavam recebendo-a em 2005, incluindo 30 mil usuários de drogas injetáveis.”
O relatório destaca ainda como motivo de preocupação estatísticas do Ministério da Saúde indicando que um terço dos jovens entre 15-24 anos se tornam sexualmente ativos antes dos 15 anos. “Essas tendências reforçam a necessidade de sustentar e ajustar esforços de prevenção”.
Como em outros países, no Brasil a ONU chama a atenção para o fato de que as mulheres continuam a ser afetadas do que homens pela doença.
Fonte: BBC Brasil
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