O Congresso Nacional aprovou, nesta segunda-feira, o projeto de resolução que limita a destinação de verba ao Orçamento por meio das emendas de relator (RP-9), suspensas por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Na Câmara, foram 268 votos a favor, 31 contrários e uma abstenção. No Senado, o resultado foi mais apertado: 34 votos a 32.
Pela proposta, o valor das emendas de relator não poderá ultrapassar a soma de emendas de bancada e individuais no momento da formulação de parecer na Comissão de Orçamento, o que, considerando os valores atuais, representaria cerca de R$ 17 bilhões. O texto também impõe a divulgação dos políticos e entidades favorecidos pelas emendas de relator — que compõem o chamado “orçamento secreto” — daqui para frente.
Os casos do passado, porém, continuarão em sigilo. Na última semana, a cúpula do Congresso editou um ato normativo para impedir a divulgação das informações em caráter retroativo. As emendas do orçamento secreto foram usadas sem transparência nos últimos anos para atender a políticos da base do governo, sem um critério claro de distribuição.
O esforço faz parte das negociações entre Legislativo e Judiciário para liberar a execução dessas emendas até o final do ano. Segundo o relator do projeto de resolução, Marcelo Castro (MDB-PI), aproximadamente R$7 bilhões oriundos de emendas RP-9 ainda não foram empenhados.
Também fez parte da mobilização parlamentar a publicação de um ato das Mesas de ambas as Casas em que a cúpula do Legislativo considerou impossível reunir a documentação para tornar públicas as indicações do passado. Argumentaram ainda que não existia norma que obrigasse essa divulgação.
Em liminar da ministra Rosa Weber, referendada pela pelo STF, havia a determinação da publicidade das indicações de parlamentares para as emendas de relator nos Orçamentos de 2020 e 2021.
O texto estipula que o relator-geral poderá atender a “solicitações recebidas de parlamentares, de agentes públicos ou da sociedade civil” e que esses pedidos serão publicados “individualmente” e disponibilizados “em relatório” no site da Comissão Mista de Orçamento.
Sobre isso, deputados questionaram que isso pode abrir margem para parlamentares usarem pedidos feitos através de prefeitos, por exemplo, para omitirem seus nomes. Marcelo Castro respondeu que “uma brecha sempre existirá”, mas que deputados e senadores têm interesse de ganhar o mérito pela liberação de emendas.
— Vai piorar com essa resolução, essa resolução cria “laranjinhas”, que são as supostas entidades da sociedade civil, ou agentes públicos, que poderiam subscrever os pedidos. É muito fácil, o Deputado da região X, do estado Y, chega a uma delegacia de polícia civil, a um diretor de hospital e diz: “Você não quer uma verbinha do orçamento do União para a sua delegacia, ou para o seu hospital, ou para a sua escolinha? Eu só não quero aparecer, assine aqui, mande para o Relator”. E está feito o “laranjal” — discursou Marcel van Hattem (Novo-RS).
Outra questão em aberto é a determinação para o Congresso tratar a distribuição deste tipo de emenda com equidade, ou seja, de forma que não haja favorecimento de alguns parlamentares em detrimento de outros.
Relator do projeto, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) admitiu que não tratou do assunto no projeto.
— Eu não trato dessa questão na resolução. A resolução não é o lugar próprio de tratar disso, o lugar próprio é no parecer preliminar (do Orçamento). Na próxima semana vamos votar o parecer preliminar na CMO (Comissão Mista de Orçamento), a comissão composta para poder fazer o orçamento (de 2022). Ela que vai estabelecer as normas de como vai fazer e como vai executar — disse Castro.
Parlamentares criticaram a ausência de uma solução para essas questões, exigidas pelo STF. Em plenário, Marcelo Castro foi cobrado.
— Eu conheço a sua meticulosidade em resolver as coisas, em buscar os detalhes. Mas vossa excelência (Marcelo Castro) não citou nenhuma frase no que diz respeito à equidade na distribuição das emendas de relator, não há equidade na distribuição — reclamou Danilo Forte (PSDB-CE).
No relatório, Castro determina que o valor das emendas de relator seja vinculada a outras emendas. “Propõe-se que esse limite máximo corresponda à soma dos valores definidos pela Constituição Federal para as emendas individuais e para as emendas de bancada estadual impositivas”, escreve o senador.
Em 2021, foram reservados em um primeiro momento R$ 30,1 bilhões para as emendas de relator. Houve, porém, mudanças na previsão. Hoje, o valor está previsto em R$ 16,8 bilhões. Já o total com as emendas individuais e de bancada, hoje, são estimadas em, respectivamente, R$ 9,6 bilhões e R$ 7,3 bilhões.
— É inaceitável que o relator do orçamento tenha mais poder que o presidente da República — disse Marcelo Castro.
Parlamentares de oposição, porém, argumentaram que a trava do projeto não vai alterar a ordem de grandeza das emendas de relator.
— A continuar isso, alguém com controle de R$16 bilhões, uma proposta talvez para a eleição do ano que vem, seja suspender a eleição presidencial e fazer eleição do Relator do Orçamento. Ele passa a ser alguém mais poderoso que o Presidente da República, que a Esplanada dos Ministérios, que o Congresso Nacional — ironizou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
— É razoável permitir que 17 bilhões de reais sejam liberados sem qualquer critério público? O dinheiro público não pode ser destinado aos parlamentares de acordo com sua proximidade ou distância do governo. O dinheiro público tem que ter uma finalidade que atenda ao interesse público, a critérios técnicos objetivos, impessoais e isonômicos. E o que essa proposta faz é o oposto disso — discursou Alessandro Molon (PSB-RJ).
Na semana passada, a cúpula do Legislativo afirmou que não divulgaria os nomes dos parlamentares que já direcionaram verbas das emendas de relator a estados e municípios. A ampla publicidade, exigida pelo Judiciário, só será colocada em prática no futuro.
Hoje, as emendas de relator estão concentradas nas mãos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Parlamentares relatam que muitas das demandas foram atendidas a partir de pedidos informais. Isso não quer dizer, porém, que não haja documentação que possa identificar os beneficiários do passado.
No Congresso, há o diagnóstico por parte do grupo favorável à decisão do STF que a divulgação desse material teria o potencial de desencadear uma crise, já que ficaria claro o favorecimento de alguns parlamentares em detrimento de outros.
— Sabemos muito bem quem manda nesse dinheiro e quem manda no relato. E quem faz acordo recebe. Por que estão querendo divulgar daqui para frente? Porque vai dar muito problema entre aqueles que fizeram acordo se eles souberem que um recebeu 10 e outro 100 para participar do mesmo acordo. Vai ser bonito ver isso porque isso vai colocar em evidência toda a negociata daqui. Quero ver fazer negociata daqui para frente quando isso vier a público. E espero que venha — discursou Paulo Ganime (Novo-RJ).
Com a aprovação do projeto e a publicação do ato, o Congresso espera que o Supremo reconsidere a sua posição e libere a execução das emendas bloqueadas.