Toda aldeia tem seus personagens. O mundo inteiro tem suas aldeias. Jacaré é um desses personagens, típicos e característicos de concentrações urbanas. Os freqüentadores da noite, a boemia, políticos e jornalistas de João Pessoa, em algum momento já foram apresentados à essa figura carismática e até certo ponto enigmática. Quem não conhece já ouviu falar. Há até quem duvide que ele exista, acham que é lenda, história, folclore.
Figura que já faz parte da memória coletiva da cidade, homem cuja biografia muitas vezes se cruza com a história de João Pessoa. Talvez um exagero, afirmar tal coisa, mas a verdade é que ele não parece conhecer limite entre o que é a história da sua vida, com a história formal e pública da cidade. À todo momento, elas se cruzam em sua narrativa. Perspectivas históricas e história de vida não apresentam limites, em um discurso composto por uma dimensão afetiva e cognitiva.
Ele existe, sim, e conta sua história. Ou melhor, conta o que deseja que conheçam dela. Em alguns momentos torna-se escorregadio e evasivo. De forma reticente finge não entender ou não lembrar. Apesar de em alguns momentos parecer realmente confundir algumas datas, ao contar histórias que usa como referência alguns fatos históricos, sua memória, quando se trata da vida pessoal parece bem nítida. A surpresa é encontrar em Jacaré, um comportamento reservado. Justo ele, sempre tão festeiro, falante e nada discreto?
Um personagem, uma história de vida – Mas uma moeda sempre tem dois lados. E o Clickpb achou por bem conhecer um pouco da história subjetiva desse personagem, fazendo uma correlação entre memória e vida. Jacaré é na verdade Antonio Joaquim de Sousa, filho de Joaquim Ananias de Sousa e Rita Ambrozio de Sousa. Natural de Patos, nascido no dia 10 de setembro de 1957. Carteira de Identidade número 1.316.496, cidadão paraibano por nascimento, pessoense por escolha e paixão. Ele tem apenas 48 anos de idade, mas aparenta um pouco mais.
Veio morar em João Pessoa em 1976, aos 19 anos. A primeira morada foi na rua Duque de Caxias, centro da cidade, próximo ao Viaduto Damásio Franca, na popular “Vila Caxia”, ele explica. Trabalhava como gazeteiro, vendendo jornais, e talvez venha daí a intimidade com os profissionais de comunicação da cidade. Jacaré é assíduo freqüentador da Associação Paraibana de Imprensa (API) e das atividades e eventos promovidos pela entidade. Em algumas ocasiões, após algumas cervejas, repete o slogan “sem a imprensa ninguém veve (sic)”.
Quanto à instrução ele diz que o pouco que estudou foi na Cartilha do Nordeste, ainda em Patos. Pela maneira como manuseia o jornal que carrega com ele, meio amassado, parece não ser muito íntimo das palavras. Mas isso não parece incomodar ou atrapalhar a vida de nosso personagem.
Que nasceu em uma família de seis irmãos. Fora ele, são quatro mulheres e um homem. Maria José, Graça, Mocinha, Luzia e Sebastião. Uma das irmãs mora aqui, no bairro do Cristo. Os demais, em Taquatinga, Distrito Federal, próximo à Capital, Brasília. É exatamente em relação à família que ele se mostra mais reticente. Deixa entender que separou-se da família quando veio morar aqui, e demonstra haver um certo distanciamento. Não confirma se foi ele que se afastou ou o contrário. O certo é que não parece haver muita convivência entre eles. Jacaré teria também deixado mulher e filhos, quando mudou-se de Patos para João Pessoa. Demonstra não gostar de falar no assunto.
Como ele vive – Hoje, abril de 2006, ele mora na Pousada São Geraldo, na rua General Osório, centro. Do ano que chegou aqui até agora, já se vão três décadas. E Jacaré não faz menção a nenhum outro trabalho, fora aquele dos primeiros dias da cidade, como gazeteiro. Se diz servidor público do Estado, anda com vários contracheques na carteira, mas não permite que se verifique a qual Secretaria ou órgão público pertence. Faz mistério. O cartão do banco, o mesmo dos servidores, também está na carteira.
Ele conta que todos os dias faz uma visitinha aos locais públicos da cidade. Assembléia Legislativa, Palácio do Governo, Câmara Municipal, Centro Administrativo de Jaguaribe. A todos que vai encontrando no caminho, pede uma ajuda. É assim que leva sua vida. Ganha 5 ‘conto’ aqui, 10 ou 30 ali, é assim que diz conseguir o seu sustento. No dia da entrevista, apesar de ter sido pego de surpresa, apresenta-se de forma elegante. Veste camisa de manga longa na cor vinho, bem passada, combinando com calça social bege. O sapato também combina e está bem engraxado.
Apesar da visível dependência econômica, diz que na porta da Assembléia, se quiser, “fala até do Papa”. Costuma fazer visitas rotineiras a várias cidades do interior, e vez por outra, quando consegue tirar a sorte grande, ganha uma passagem para ir até Brasília. Aí ocorre um fato curioso, porque ele conta sua história de peregrinação ao Congresso e ao Senado, a fim de fazer visitas aos políticos paraibanos, como profundo conhecedor da geografia de seus corredores.
Vai narrando um a um o político, andar e número do gabinete. Diz que na viagem de volta, “quando vem liso”, traz na bagagem cerca de 2 mil reais, que gasta com “cachaça e mulher”, quando chega em casa. Malandro, mostra um ofício que utilizou recentemente para pedir uma passagem, onde alega que pretender ir à Brasília procurar melhores condições de vida e trabalho. Não deixa de ser verdade.
Um trauma – Assunto recorrente em quase toda a sua narrativa foi um episódio em que teria sido preso, segundo ele, por causa de uma denúncia de que seria um “maníaco”. Mas que segundo Jacaré, foi motivado por causa da política e por preconceito. Jacaré é negro. Teria também outra razão, que ele resume com a seguinte frase, “eles com dinheiro e eu liso”. A história, apesar de contada várias vezes, é repetida de forma confusa.
Uma paixão – Torcedor fanático do Botafogo da Paraíba, acompanha o time onde quer que ele vá, não importa a distância. Já foi ao Rio de Janeiro e Salvador, seguindo seu clube. É quase um mascote, e durante os jogos não dá sossego para a torcida adversária. Também torce para o Nacional de Patos, time da sua cidade natal. Diz que o torcedor do Botafogo é pacífico, que recebe os ‘trezeanos’ e ‘campinenses’ sempre bem, sem violência.
A origem do nome – O apelido, Jacaré, teria surgido quando ainda era gazeteiro e costumava apostar no jogo do bicho. Jogava sempre no 15, o número correspondente ao animal silvestre, um réptil que habita o planeta desde a era pré-histórica, contemporâneo dos grandes dinossauros. Também é chamado de caroço de pinha, segundo ele porque também é preto. E já foi chamado de ‘telefone’, uma paródia àqueles modelos de telefones antigos, pretos.
Apesar de ter passado as últimas décadas vivendo e sobrevivendo praticamente graças à política local, e por muitas vezes defendendo de forma apaixonada este ou aquele candidato ou figura pública, Jacaré conclui a nossa conversa com a seguinte frase: “Meu partido é viver na paz”.
Comprovando mais uma vez que a dualidade e o mistério fazem parte da sua personalidade.
Lilla Ferreira
ClickPB
Jacaré é um típico personagem da cidade, pessoense por paixão e opção
Veio morar em João Pessoa em 1976, aos 19 anos. A primeira morada foi na rua Duque de Caxias, centro da cidade, próximo ao Viaduto Damásio Franca, na popular “V
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