Enchente

Bombeiro que comandou força-tarefa da Paraíba relata desastre no Rio Grande do Sul: “cena apocalíptica” 

O Corpo de Bombeiros Militar da Paraíba levou 17 militares especialistas em desastres, salvamentos e deslizamentos, além de cães, viaturas, embarcações e equipamentos. 

Corpo de Bombeiros, Paraíba, Rio Grande do Sul, enchentes

Comandante da força-tarefa da Paraíba relata experiência no Sul. (Foto: Clilson Júnior)

Há 24 anos atuando no Corpo de Bombeiros Militar da Paraíba, o tenente-coronel Arthur Vieira, que comandou a força-tarefa enviada pelo estado para o Rio Grande do Sul, afirmou que esta foi uma das maiores operações de catástrofe em seus 24 anos de atuação na corporação. “Quando chegamos em Porto Alegre, era uma cena apocalíptica”, afirmou, no programa Arapuan Verdade desta quarta-feira (22), como acompanhou o ClickPB

Ele lembrou que tudo começou na partida. “Quando começamos a nos mobilizar, houve uma comoção popular. Pessoas que tinham familiares lá entregando o endereço, nos pedindo para salvar. Quando chegamos em Porto Alegre, era uma cena apocalíptica.  Todos os veículos saindo da cidade e nós, em comboio, entrando”. 

O tenente-coronel relatou que as pessoas perderam literalmente tudo. “É muito triste. Fomos dar um alento, mas nos sentimos impotentes pela magnitude do evento. Foi quase todo o Rio Grande do Sul sofrendo com esse problema”, afirmou.

Da Paraíba, foram escalados 17 militares especialistas em desastres, salvamentos e deslizamentos. Também foram duas cadelas de busca certificadas internacionalmente, cinco viaturas, três embarcações e toneladas de equipamentos. 

“O mais difícil é, talvez, gerir o grande desastre. Uma cidade inteira assolada pelo mal climático. O que falamos muito é que o bombeiro militar lida todos os dias com dilemas, quem salvar primeiro. Ele tem que escolher. Esse dilema, é importante entender que não vamos fazer tudo”, comentou Arthur Vieira. 

Comandante afirma que bombeiros não são heróis

“Se coloca muito o termo de que bombeiros são heróis. Não somos. Somos seres humanos, falhos, temos nossas dificuldades, mas o que diferencia é o nosso treinamento, capacitação e a vontade de fazer o nosso papel”, pontuou.

O comandante explicou que, durante os dias em que a equipe paraibana ficou no Rio Grande do Sul, deu prioridade às famílias que precisavam de medicações e precisavam ser retiradas dos locais. 

“Passamos nos locais e vimos famílias em cima dos telhados. A prioridade era salvar pessoas, trabalhando o dia todo, fazendo revezamento, respeitando protocolos, mas a vontade era trabalhar 24h”, lembrou. 

Solidariedade

O comandante relatou que os bombeiros da Paraíba foram muito bem acolhidos pelos bombeiros do Rio Grande do Sul, que gerencia a operação, e pela população. “Todo o Brasil se mobilizou , os Corpos de Bombeiros”. Ele ressaltou que a gestão feita pela Ligabom foi essencial para organizar a situação, sabendo o que cada corporação tinha para oferecer. “É uma mobilização gigantesca”.

O Corpo de Bombeiros da Paraíba tem uma doutrina específica com relação a atendimento a desastres. Essa doutrina ensina que a equipe deve ir com autonomia plena, desde água, alimentação, sacos de dormir. 

No Rio Grande do Sul, os batalhões que não foram afetados acolheram os paraibanos e, nesses prédios, eles colocaram seus sacos de dormir nos auditórios e foram se revezando no trabalho. 

“Também me chamou a atenção a solidariedade do povo do Brasil, mas, sobretudo, do povo gaúcho. Mesmo aqueles que perderam tudo estavam lá ajudando. Mesmo num momento de dor, mesmo sem ter nada, ofereceram algo para nós”.

Desafios e reconstrução

Como a energia elétrica precisou ser cortada para evitar choques elétricos, os bombeiros precisaram enfrentar noites muito escuras. “Era um breu total. Nos comunicávamos por lanterna, apito”, contou o bombeiro Arthur Vieira.

“Vimos pessoas sendo levadas com crianças de colo. No primeiro dia, uma senhora me pediu para levar roupas, alimentos, medicações no meio da cidade, uma casa de primeiro andar, cercada por água. A família dela estava lá, e eu não poderia separar esse núcleo familiar”, relatou.

Arthur Vieira recordou que fez um trato com ela. “Disse que iria ver as condições, tentar levar as crianças para um abrigo. Mas, o núcleo estava tão bem constituído, ali era o lar deles. Estava seguro porque era o primeiro andar. Ela decidiu ficar e não pudemos impedir”. 

Com a água descendo, a cidade estará tomada por lama, detritos, corpos e, por isso, a fase crucial a partir desse momento é a reconstrução, como afirmou o comandante. “Aquelas casas são as histórias daquelas pessoas”. 

Ele lamentou também o fato de que algumas pessoas se aproveitaram da situação para saquear casas durante a noite. 

Outra preocupação, segundo ele, é que toda a rede de água foi contaminada. Por isso, há tanta necessidade de água. “O material essencial nesse momento é medicação, água, alimento e orações”.

Culpados

“Estudamos a região para entender a catástrofe. É uma região de vales. A população está num local não adequado para moradia. Historicamente, há recorrentes enchentes naquela região, como ocorreu ano passado. Em 1942, houve uma enchente dessa magnitude”, declarou o comandante. 

Ele não apontou culpados, mas afirmou: “A natureza está se impondo para tomar o seu lugar e o homem está lutando para lutar contra a natureza. A natureza está tomando o seu lugar”, enfatizou.

Ele ressaltou que ninguém está preparado para um desastre. “Fazemos planejamento, mas o que acontece é que as pessoas não estão preparadas. Chegamos lá numa situação organizada. Tinha um posto de comando, um gabinete de crise instalado para que se orquestrasse os recursos. Apesar de todo o caos tinha uma estrutura mínima que estava resolvendo. As demandas do Corpo de Bombeiros, íamos atendendo”. 

Para o comandante, o clima é um fator complicador. “A chuva ia aumentar o nível dos rios, além da chegada de uma frente fria. As pessoas mais antigas diziam que estavam torcendo para a frente fria, porque quando isso acontece não chove. A direção do vento lá também influencia. Se houver uma frente sul, ele fica embarreirado. Agora, as águas começam a ser escoadas para o oceano”, explicou.

Experiência

O comandante comentou ainda sobre o que fica dessa experiência: “A gente fica honrado em ser escolhido e autorizado pela instituição e poder ajudar as pessoas, ser tão bem acolhido, saber que estamos fazendo algo de bom pelas pessoas, fazer a diferença. Quando chegamos para fazer o resgate, as pessoas choravam para agradecer. Isso, tentando ser forte porque, por dentro, estávamos emocionados”, disse.

Várias vezes, segundo ele, ouviu relatos dos companheiros sobre os salvamentos realizados. “Uma criança que resgatei tinha três anos, mesma idade da minha filha. É difícil dissociar a imagem dos nossos entes. Quem sabe um dia, a gente precise e teremos quem vai nos ajudar. Agradeço por ter feito a diferença”, concluiu.

Foto: Clilson Júnior.

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