SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo russo declarou a pequena vila de Nionoksa, no Ártico, uma “zona de perigo” devido a um experimento militar secreto que será conduzido entre terça (7) e quarta (8).
Os cerca de 2.000 moradores terão ônibus à disposição para deixar a cidade, sendo provavelmente levados para o centro regional mais próximo, Severodvinsk, a 40 km dali. Navios navegando no mar Branco, que banha a região, também foram alertados para se afastar nesses dois dias.
Observadores militares se perguntam qual a natureza do teste. Em agosto do ano passado, uma grande explosão durante o que especialistas disseram ser o teste de um novo míssil russo já havia provocado um alerta em Nionoksa. Naquele episódio, cinco técnicos morreram quando o motor de um míssil de cruzeiro movido a energia nuclear explodiu, em uma plataforma no mar. Houve um pico de radiação, registrado nos países vizinhos.
A agência nuclear russa, a Rosatom, foi duramente criticada pela falta de transparência no episódio. O país tem um histórico traumático na área, com a tentativa de acobertamento do desastre nuclear em Tchernóbil pela União Soviética, em 1986.
Nionoksa fica próxima do principal centro de testes de mísseis da Marinha russa, que está lá desde os anos 1950.
O teste desta terça pode ser uma nova tentativa envolvendo o míssil, chamado Burevestnik (nome russo da ave marinha petrel), ou mesmo um teste marítimo do chamado “torpedo do Juízo Final”.
O torpedo, um drone submarino chamado Poseidon, pode levar uma carga especulada de até 100 megatons (ou 6.600 bombas de Hiroshima) a distâncias superiores a 10 mil quilômetros.
Ambas as armas fazem parte do pacote anunciado em 2018 pelo presidente Vladimir Putin como sendo supostamente invencíveis. Não existe isso, mas as características apresentadas dificultam, e muito, o trabalho de defesa dos alvos. Vistos inicialmente com ceticismo, os armamentos começaram a ser levados a sério pelo Ocidente. O Burevestnik já tem até uma designação da Otan (aliança militar ocidental), SSC-X-9 Skyfall.
Os testes russos foram acompanhados por uma revisão da doutrina militar nuclear do país, a maior potência no setor ao lado dos Estados Unidos -ambas as nações concentram mais de 90% do arsenal atômico do mundo, com capacidades semelhantes.
Putin reafirmou a possibilidade de retaliar com armas nucleares contra ataques estratégicos, que ameaçam a existência da Rússia ou de aliados, mesmo que eles seja de natureza convencional.
Desde que assumiu o poder em 2017, o presidente Donald Trump tem incentivado uma disputa no campo com os russos e os chineses, que são uma potência emergente.
Os EUA deixaram dois acordos de controle de armas e têm trabalhado para deixar expirar o Novo Start, maior tratado de redução e contenção de ogivas estratégicas em vigor.
Ele vence em fevereiro de 2021, e Washington diz que só irá renová-lo com Moscou por cinco anos se Pequim também aderir ao texto -algo que russos e chineses descartam.
Alem disso, os americanos atualizaram sua doutrina nuclear de forma a ampliar a possibilidade do uso de armas nucleares táticas, de menor potência e emprego limitado, e passou a operar uma nova ogiva com essas características.
Para especialistas na área, o risco do eventual emprego é a escalada, imprevisível e que acabe por envolver as grandes armas estratégicas, aquelas que destroem países.