A estréia de Minha Nada Mole Vida, nova “sitcom” da Globo, mostra um programa que segue à risca a receita do bolo. Mas não é daqueles bolos confeitados tradicionais. Conta com os mesmos ingredientes moderninhos tão presentes nos textos de Alexandre Machado e Fernanda Young, autores da produção.
Com as mesmas pitadas humoradas que discutem as relações contemporâneas, como nos extintos Os Normais e Os Aspones, também da dupla, o novo programa conta com um diferencial: uma criança num nicho de humor adulto. O que, de certa forma, gera um certo incômodo inicial. O desconforto parte da ausência total de inocência num diálogo infantil, recheado de malícia nos ágeis bate-bolas com Luiz Fernando Guimarães durante as cenas do seu personagem Horácio com Hélio, seu filho, vivido pelo esperto David Lucas. Nos primeiros minutos do programa, a impressão que se tem é que o Rui de Os Normais se separou de Vani, de Fernanda Torres, e teve um filho com outra mulher. Afinal, fica evidente que é difícil para Luiz Fernando se livrar dos trejeitos do antigo personagem.
Mas, a partir do momento em que a linguagem contemporânea da dupla de autores, incrementada com a eficiente direção de José Alvarenga Jr., começa a esbarrar na caricatura, o Rui se transforma numa imagem embaçada. Entra em cena a explícita e feroz crítica aos repórteres de celebridades, principalmente ao Amaury Júnior. Chega a ser constrangedor escutar a música de abertura do fictício programa Horácio By Night, a Everybody Dance Now, que mais lembra a abertura do Programa Amaury Jr, da RedeTV!.
Isso sem falar nas habituais gafes que Horácio comete ao entrevistar as tais celebridades, como direcionar o microfone para um entrevistado enquanto conversa com outro que está ao seu lado. Para ninguém ter dúvidas de que se trata de uma sátira ao programa de Amaury, surgem referências a um balneário em Punta Del Leste – um clássico patrocinador do programa da Rede TV!. E a edição da vinheta de abertura, com “takes” de várias “celebridades”, também confirma a “inspiração” do programa da Globo, que manteve a habitual média de audiência do horário, 18 pontos de média, com share de 33%, considerada satisfatória e previsível para uma sexta à noite.
O que não era tão previsível, mas deu certo, foi a “aquisição” da atriz Maria Clara Gueiros, retirada temporariamente do humorístico Zorra Total para viver Silvana, a ex-mulher de Horácio. Segura e com afinidade com o texto descontraído, a atriz foi a melhor surpresa do programa, sempre dentro do tom. Nas cenas dela, a produção optou por esbanjar nos exemplos politicamente incorretos. Como Silvana falando no fone de ouvido do celular enquanto dirigia, o que ainda é proibido por lei.
Mas as cenas mais inusitadas foram as que mostraram um “acordo” entre Horácio e um juiz, que decide com quem Hélio vai passar os finais de semana. Em determinado momento, o jornalista se oferece para fazer uma matéria sobre o casamento da filha do juiz em troca de conseguir vantagens no acordo com Silvana. Em contrapartida, a acidez de Fernanda e Alexandre exibe cruelmente a falta de glamour do cotidiano de um repórter de celebridades. Mas exagera um pouco no cenário, absolutamente envelhecido e de aparência suja, que é amenizado apenas pelo correto figurino, assinado por Ellen Millet.
Com essa colcha de retalhos já tão familiar dessa equipe, que assina os programas de Alexandre e Fernanda desde a estréia de Os Normais, em 2001, Minha Nada Mole Vida é uma espécie de enlatado moderno. Reflete a eficaz mas já conhecida linguagem pseudo-cabeça de uma relação. Ou seja, parece que Fernanda Young sempre serve de inspiração para Alexandre Machado descrever os altos e baixos do sistema nervoso da mulher contemporânea. Um tanto quanto neurótica em algumas circunstâncias, mas sem jamais perder o humor.
TV Press
