Não quero colocar água no leite e nem tão pouco soda cáustica na boca do povo, mas desde que me entendo de gente e abracei a cultura como projeto de vida, escuto reclamações fragmentadas de vários setores relacionados. Seja na música, no teatro, nas artes plásticas, na cultura popular, no áudio visual, na literatura, na dança ou em qualquer outra área cultural, a Paraíba anda cambaleando, sem rumo e sem direção, na concretização de um projeto maior que leve seus atores para um patamar digno de respeito, reconhecimento e garantia mercadológica.
Recentemente o cineasta, jornalista e produtor cultural Lúcio Vilar assumiu a presidência da Fundação Cultural de João Pessoa (leia-se Funjope). Com toda boa intenção e competência que lhe é peculiar dificilmente haverá tempo para Lúcio por em prática algum projeto capaz de mudar o conceito que foi estabelecido na Fundação durante as duas últimas gestões. E não são poucos os erros, tanto da gestão municipal como da estadual que, diga-se de passagem, é gerida por um só partido.
Em defesa da música, por exemplo, já apareceram vários movimentos que até hoje não sabemos para que veio. Cadê a “Guerrilha Cultural” e os movimentos do “Musiclub” defendidos pelos até então considerados “vanguardistas” da música na Paraíba? Onde estão os conceitos apregoados nos anos 70 pelo “Jaguaribe Carne” e que prometiam uma verdadeira revolução caso chegassem um dia ao poder? Pelo que me consta, estas pessoas estão devidamente sentadas ao lado do trono do “Rei” e pouco fazem para que alguma coisa de boa aconteça verdadeiramente na Paraíba. E não adianta dizer que o pensamento das esquerdas mudou. Isso é papo para boi dormir e falta de vontade de querer pelo menos tentar fazer movimentar uma política cultural capaz de revolucionar e alavancar toda nossa potencialidade. É só olhar para trás e ver o comportamento destes “girassóis”. No período em que aconteceu o “Folia de Rua”, por exemplo, alguém por acaso viu o Secretário de Cultura prestigiar algum bloco? Não? Nem eu! Será que o nosso carnaval também não é cultura? Pelo que a imprensa noticiou, ele preferiu tocar em canjas esporádicas em palcos pernambucanos. Nada contra Pernambuco, mas nossa prévia dá de 10 em qualquer Estado do Brasil e, além disso, todo gestor tem a obrigação de estar presente nos eventos, sejam eles considerados de pequeno ou de grande porte do estado. Faz parte, inclusive para avaliar e aperfeiçoar possíveis erros que possam existir. É esse o papel do gestor seja de qual pasta for. Não basta ser apenas relações públicas e promoter do governo. É triste e vergonhoso ver colegas que até então eram considerados pensantes da cultura local sendo cooptados e acomodados por uma situação passageira, todos caladinhos com seus salários, balançando a cabeça como se fossem lagartixas e o que é pior, defendendo tudo que é de errado e inconsistente no governo. É triste, mas entendível! Todos, na verdade, demonstram nunca terem tido compromisso maior com o setor. Ao chegar ao poder perceberam que é melhor pensar nos seus umbigos e ter um “momento digno de sobrevivência” do que verdadeiramente defender aquilo que um dia acreditou. Uns ainda tentam fazer, mas são barrados pela centralização antidemocrática dessas gestões e pela falta da caneta e autonomia. Outros, por sua vez, foram cooptados ou corromperam-se! Essa é a verdade! Será que não sabem, no entanto, que o poder é passageiro e preferem jogar no lixo toda uma história de luta e independência?
Enquanto a Cultura Popular que Emilson do CPC (Centro Popular de Cultura) fez acontecer no Bairro dos Novais e depois que transferiu a experiência para a gestão socialista levou um “chute no terminal do cóccix”, os grupos de dança cambaleiam em busca de espaço e reconhecimento marcando literalmente o passo sem encontrar o compasso da sobrevivência. Estes artistas estão cada vez mais pobres, sem patrocínios e rodando o pires entre gabinetes políticos e empresas privadas para não morrerem de fome. No teatro não é diferente. Atores e diretores olhando no horizonte sem espaço e perspectiva de montar seus espetáculos. Muitos, amordaçados e perdidos em seus discursos. Talvez, por medo de provocar discórdias ao governo, fiquem subordinados às ordens expressas da Secult e da Funjope, até bem pouco tempo tidas como uma só entidade.
As limitações da área cultural são cada vez mais evidentes. O pouco que existe em relação ao Fundo Municipal de Cultura (FMC) é carta marcada para quem defende o projeto socialista ou faz parte da “diretoria”. Muitos destes projetos aprovados são direcionados aos próprios frequentadores da Funjope ou pessoas ligadas diretamente ao governo. Enquanto alguns deles não passam sequer pelo julgamento da comissão de seleção, outros acabam sendo pré-julgados pela burocracia dos gestores ou pela perseguição política. É só olhar os nomes e sobrenomes dos recém-aprovados para ver que não estou exagerando. A panela é a mesma! O FIC (Fundo de Incentivo à Cultura) se perdeu no tempo e hoje quase não se comenta sobre o assunto. O Fenart deixou de existir. O “Espaço Cultural” está de mal a pior e reforma que é bom só na virtualidade do computador. Os projetos sumiram! Há meses não acontece o projeto “Som das Seis”, criado pelo governo com o intuito de concorrer com o Projeto Seis e Meia. Aliás, você conta nos dedos os shows realizados pelo “Som das Seis” e já nem sei se esse programa continua a existir. É tudo uma mentira e ninguém fala nada!
Afora o “Sabadinho Bom” que acontece no centro e que caiu na graça de muitos, mesmo sem ter divulgação, nada temos a comemorar. O Circuito das Praças, realizado pela Funjope é uma enganação para justificar o vazio cultural da cidade, quando não é transformado em palanque político. Em dias de show, não há sequer um agente representante da Fundação para recepcionar os artistas. Nem mesmo um locutor para apresentar a banda é disponibilizado para o evento. O som é uma droga, a divulgação é uma droga, a produção é uma droga e o público inexistente. Estamos ficando viciados em drogas! A Funjope virou uma grande produtora de shows e eventos sazonais da cidade, o que é uma droga. Os cachês são fantasiosos e os descontos exagerados, o que é outra droga. Receber um cachê às vezes demora mais de um mês! Tem droga maior? Será que isso acontece com os artistas nacionais que tocam na “Estação Nordeste” todos os anos? Com certeza, não! Em outras palavras, o Circuito das Praças passou a ser um “cala boca” oficial para deixar os artistas sem ter do que reclamar ou, no mínimo, podar seus verdadeiros pensamentos. Dessa forma se contentam com o “muito pouco” em vez de “nada ter” e ficam calados! Provavelmente com medo! Tomara que com a implantação do Conselho Municipal de Cultura que, vale salientar, ficou adormecido por mais de 7 anos, alguma coisa mude, o que acho pouco provável. É só olhar a relação dos conselheiros para entender que ele só é “paritário” na cabeça de quem o implantou. Na verdade, está tudo dominado e a última palavra será sempre do governo!
Vivemos uma contradição sem precedentes. Os “amigos” que estão no poder e que um dia surpreenderam com atitudes revolucionárias e até mesmo extravagantemente anarquistas, foram literalmente engolidos pela fantasia do deslumbre e do poder. A cultura adoeceu e os agentes culturais do governo agem naturalmente como se nada estivesse acontecendo. E o pior é que nada realmente acontece! Será que é isso que o segmento quer para a nossa cidade e o nosso estado? Creio que não! Só acredito que nada vai mudar enquanto a gente não mudar tudo! Acorda João Pessoa! Acorda Paraíba! Botem a boca no trombone ou calem-se de vez! Mas não diga que não avisei…