Eduardo Varandas

Câmara Medieval

CMJP poderá violar direito de mulheres transgênero

Câmara Medieval

Tramita, na Câmara Municipal de João Pessoa, projeto de lei de autoria do Vereador Cel. Sobreira (PL 1305/2023), do MDB, o qual visa a impedir que mulheres transgênero “ainda em processo de transição, mas que ainda guardem fenótipos masculinos” utilizem o banheiro feminino.  

Para piorar o cenário dantesco, anacrônico e de rematado dislate, o PL adentra ignorantemente na biologia humana, para resumir “fenótipos masculinos” à existência de “pênis, testículos, barba, insinuação azulada de barba e Pomo de Adão”.

Melhor explicando! Mulheres transgênero que tenham pênis ou qualquer característica masculina minimamente perceptível não poderão frequentar sanitários destinados às demais mulheres.

Remanesce uma pergunta aos vereadores que apoiam a medida diabólica: quem vai averiguar o pênis da mulher “trans” a fim de permitir-lhe ou negar-lhe o acesso à latrina?

O desvario chega a tamanho disparate que violentam até dogmática médica. Com efeito, o Pomo de Adão é uma saliência do osso hioide, junto à laringe. Homens e mulheres têm o Pomo de Adão. Entrementes, o órgão é mais destacado e visível nos homens cisgênero devido a maior produção do hormônio da testosterona. Todavia, a literatura médica registra que mulheres cisgênero podem ter o Pomo protuberante (similar a homens) devido a disfunções hormonais ou por questões genéticas.

E então? As mulheres com vagina e Pomo de Adão mais evidente vão ser impedidas de frequentar os banheiros apropriados?

Tem mais: usurpando a atribuição do Congresso Nacional (que detém competência legislativa exclusiva para legislar sobre direito penal),  o PL cria forma inconstitucional e absurda excludente de tipicidade ao asserir que “não incorre em transfobia a pessoa que solicitar a saída de pessoa presente em banheiros, toaletes, vestiários e cabines femininas” (“sic”).

O Supremo Tribunal Federal já decidiu que são consideradas pessoas transgêneros aquelas que se identifiquem com o gênero oposto ao de nascença, independentemente de terem sido submetido a cirurgias ou procedimentos médicos mais invasivos, equiparando-as, para todos os fins, a cisgêneros.

Assim, a eventual lei municipal, para além de cruel, inoportuna e mal redigida, impõe elemento discriminatório inconcebível, ao diferenciar as mulheres “trans” pela aparência feminina ou genitália, ferindo de morte o princípio da dignidade da pessoa humana (art.1°, inciso III / CF ) e o da não discriminação (art.3°, inciso IV ), além de estuprar a competência legislativa da União para tratar de Direito Penal (Art. 22, inciso I/CF).

Alerto aos desavisados que, independentemente de eventual conversão do projeto em lei, incorrerá em crime de racismo o indivíduo que obstruir o acesso de mulheres “trans” a toaletes femininos nos termos do disposto no artigo 20 da Lei Federal nº 7.716/1989 (aplicável a atos LGBTfóbicos).

De toda sorte, se parida a macabra lei pela CMJP, caberá representação de  inconstitucionalidade para instituições com legitimidade para propor Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental junto ao Supremo Tribunal Federal.

Vergonhoso!

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