Clilson Júnior

Bombas e Barrigas

A história que Rubens Nóbrega conta neste domingo em sua coluna no Jornal da Paraíba, aconteceu na primeira gestão de […]

A história que Rubens Nóbrega conta neste domingo em sua coluna no Jornal da Paraíba, aconteceu na primeira gestão de Ricardo Coutinho como prefeito de João Pessoa, onde a Saúde era comandada por Roseana Meira.

Ao longo desses anos, centenas de denúncias recheadas de falsidades chegaram a mim sem documentos, apenas picaretagem dos denunciantes. Todas que assinei e publiquei foram minuciosamente checadas antes de quaquer publicação.  Não me arrependo de nada que publiquei,  não me arrependo de nada, pois faria tudo de novo.

 

 

BOMBAS E BARRIGAS – Rubens Nóbrega

 

O editor do portal entrou na redação gritando por Clilson Júnior, um dos poucos que ainda exercitam na Paraíba o chamado jornalismo investigativo. Por essa e outras, detonador melhor não poderia haver para a suposta ‘bomba’: a internação no Hospital Infantil Arlinda Marques, em estado gravíssimo, de uma garota de oito ou nove anos de idade, doente renal, aparente vítima de suposto erro médico que consistiu em aplicar na menina uma medicação injetável com prazo de validade pretensamente vencido. O procedimento infeliz, denunciava um exaltado tio da paciente, acontecera em unidade de saúde da Capital. 


Aquilo seria um prato cheio para aquele serviço jornalístico, que não poupava de denúncias cabeludas e críticas contundentes o governo do então prefeito Ricardo Coutinho. Mas a notícia jamais foi publicada, graças à responsabilidade do repórter encarregado de apurar o fato e fazer dele mais um ou o mais novo escândalo protagonizado pela gestão municipal da época. Graças a Clilson Júnior, portanto, o hoje govenador – talvez ele nem saiba – livrou-se de ter seu nome vinculado a mais uma tragédia que não se consumou graças, também, à excelência de atendimento recebido pela criança no Arlinda Marques. 


O fato é que ela foi levada à UTI com os rins paralisados. Ficou irreconhecível, de tão inchada. “Tudo culpa da incompetência do pessoal do PSF, que aplicou uma injeção nela sem olhar que o remédio tava vencido”, contou o indignado tio da ‘vítima’, que logo nas primeiras horas de internação dava como iminente a morte da sobrinha e, para comprovar, entregou ao jornalista – para fotografia – a prova do ‘crime’: um frasco onde aparecia bem visível a data que atestava a perda de validade do medica- mento. O jornalista procurou ouvir os médicos do hospital, mas não obteve informações conclusivas de qualquer um deles sobre o que realmente causara aquela reação no organismo da paciente. Resolveu, então, visitar o Posto de Saúde da Família onde ela fora atendida. Encontrou enfermeiras muito firmes na negação da possibilidade levantada pelo denunciante.


De volta à redação, antes mesmo de abrir o computador no qual trabalhava, começou a ouvir os gritos e cobranças do editor. “E aí, cara, cadê a matéria? Vamo, vamo logo que é pra dar tempo de repicar na Câmara, na Assembleia e nos programas de rádio de meio dia”, pressionou. Em resposta, Clilson informou que alguma coisa não estava batendo naquela história, que era preciso ter calma para não cometer uma barriga e outras ponderações do gênero. Impaciente e irritado, mas sem argumentos para questionar a prudência do colega, o ‘chefe’ aceitou parcialmente os argumentos, mas fixou novo prazo para a entrega do texto. “Vou deixar pro final da tarde, mas vê se não passa disso”, disse. 


Clilson sequer foi almoçar naquele dia e por um lance de sorte fez a primeira descoberta que o ajudou a desvendar as prováveis más intenções por trás daquela denúncia. Aconteceu quando resolveu ampliar a foto do frasco do remédio para publicá-la de modo a destacar a data referente à validade. Na ampliação sobreveio a granulação e nos poros que se abriram na superfície do detalhe deu para ver nitidamente o que poderia ser – e era – uma outra data encoberta por aquela que aparecia em primeiro plano. Sem querer acreditar no que estava vendo, Clilson leu direitinho todo o rótulo do vidro. Reparou, então, que o medicamento fora fabricado pelo Lafepe – Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco. Não teve dúvida. Ligou imediatamente pra Recife e falou com o técnico responsável pelo controle de qualidade do lote ao qual pertenceria aquela unidade. 


“Esse lote não existe”, disse categórica e convincentemente ao jornalista o funcionário do Lafepe diante do número ou código lido ao telefone por Clilson. Depois dessa, não restava dúvida: o rótulo fora adulterado e a data de validade alterada para incriminar alguém do PSF da Prefeitura ou, então, queimar mais um pouco o filme da administração municipal, particularmente da Secretaria de Saúde. E se o rapaz do Lafepe dizia que aquele lote não existia, não existia. Não havia como duvidar, pensou Clilson, de alguém que trabalha numa instituição daquela respeitabilidade, que leva o nome do saudoso Miguel Arraes, foi criado em 1966 e é o segundo maior laboratório público do Brasil. Além disso, fabricante de remédios com preços extremamente acessíveis, que propiciam sua distribuição em larga escala para as camadas da população com menor poder aquisitivo. 


Desmascarada a bilontra, Clilson chamou o editor e comunicou que a bomba sequer teria efeito de traque. Mais: se publicada, faria o portal cometer uma tremenda barrigada, pois nada do que fora denunciado correspondia à realidade dos fatos. A menina internada estava daquele jeito por alguma evolução de sua doença ainda não diagnosticada, não porque lhe fora ministrado um remédio vencido. Os dois ainda discutiram a alternativa de publicar a história com a versão que descaracterizava e desmoralizava a acusação original, mas resolveram deixar pra lá, fazer por menos, na crença de que a fraude poderia não ter sido perpetrada pelo tio da garota enferma. Mas, mal terminavam a conversa, o telefone da Redação toca e quem atende chama Clilson.


– E aí, meu caro repórter, a que horas sai a matéria? – quis saber o denunciante.

– Olha, amigo, eu preciso de mais alguns detalhes e gostaria que você viesse até aqui, na sede do portal – convidou o jornalista. 

– Oxe! Só se for agora. Chego aí em dez, quinze minutos – prometeu o interessado em explodir a ‘bomba’. 


O homem apareceu no portal em menos tempo do que o previsto. Logo foi levado a uma sala reservada, onde Clilson lhe narrou tudo o que fora apurado. O homem ficou contrafeito, um tanto pálido, parecia suar em pleno ar condicionado, mas, passados alguns segundos, recompôs-se, pigarreou e sugeriu na maior cara de pau:

– Olha, se você quiser, arrumo um frasco com data vencida de verdade. Que tal?

Clilson despachou o sujeito. Mas, ao me contar essa história, não revelou quem é ou era essa figura. Deu-me apenas uma dica: exerce mandato em um dos nossos parlamentos. É político, portanto, mas do tipo que já sai de fábrica com prazo de validade vencido. Mesmo assim, consegue ludibriar muitos eleitores. Eleitores que não costumam ler direitinho os rótulos e tomam qualquer porcaria que lhes prescrevem.

COMPARTILHE

Bombando em Clilson Júnior

1

Clilson Júnior

19 de março de 2017, Lula em Monteiro

2

Clilson Júnior

Vené, o senador de Lula

3

Clilson Júnior

E agora Ruy Carneiro?

4

Clilson Júnior

O Big Brother do Padre Egidio e as gravações que vão balançar o poder

5

Clilson Júnior

Padre Egidio na cadeia, viva o TJ da Paraíba