A prisão do ex-deputado Eduardo Cunha nesta quarta-feira (19) divide opiniões, sobretudo entre os políticos. Árduo defensor da prisão de Cunha, que foi responsável pelo recebimento do pedido que resultou no impeachment de Dilma, o deputado Anísio Maia (PT) não entendeu o porquê da prisão do peemedebista neste momento. Para o parlamentar estadual, o instituto da delação premiada pode estar por trás dessa prisão, já que Cunha não foi condenado ainda, para que seja preso.
O mandado de prisão preventiva expedido pelo juiz federal Sérgio Moro contra o ex-deputado federal Eduardo Cunha, foi cumprido pela Polícia Federal na tarde desta quarta-feira (19), atendendo a pedido da força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba. Saiba os motivos:
Segundo o MPF, a liberdade do ex-parlamentar representava risco à instrução do processo, à ordem pública, e ainda haveria a possibilidade concreta de fuga em virtude da disponibilidade de recursos ocultos no exterior, além de ter dupla nacionalidade (Cunha é italiano e brasileiro).
Anísio Maia disse que a delação dele interessa a todo o Brasil, desde que seja séria e imparcial, e que os argumentos oferecidos pelo MPF para justificar a prisão preventiva é “pura tecnicidade”, pois na sua opinião teoricamente qualquer pessoa oferece risco à investigação. Anísio discorda da medida:
“Essa prisão de Cunha é arbitrariedade e não vai fortalecer a Justiça no Brasil. Acho que ele é um corrupto, que ele deve ser preso por 20 anos, mas tudo dentro da lei”.
Veja abaixo a argumentação dos procuradores do MPF do Paraná:
Risco à investigação – De acordo com o MPF, diversos fatos evidenciaram a disposição de Eduardo Cunha de atrapalhar as investigações, utilizando-se inclusive de terceiras pessoas. Como exemplo, os procuradores citam: 1) requerimentos no Tribunal de Contas da União (TCU) e Câmara dos Deputados sobre a empresa Mitsui para forçar o lobista Julio Camargo a pagar propina a Eduardo Cunha; 2) requerimentos contra o grupo Schahin, cujos acionistas eram inimigos pessoais do ex-deputado e do seu operador, Lucio Bolonha Funaro; 3) convocação pela CPI da Petrobras da advogada Beatriz Catta Preta, que atuou como defensora do lobista Julio Camargo, responsável pelo depoimento que acusou Cunha de ter recebido propina da Petrobras; 4) contratação da Kroll pela CPI da Petrobras para tentar tirar a credibilidade de colaboradores da Operação Lava Jato; 5) pedido de quebra de sigilo de parentes de Alberto Youssef, o primeiro colaborador a delatar Eduardo Cunha; 6) apresentação de projeto de lei que prevê que colaboradores não podem corrigir seus depoimentos; 7) demissão do servidor de informática da Câmara que forneceu provas evidenciando que os requerimentos para pressionar a empresa Mitsui foram elaborados por Cunha, e não pela então deputada “laranja” Solange Almeida; 8) manobras junto a aliados no Conselho de Ética para enterrar o processo que pedia a cassação do deputado; 9) ameaças relatadas pelo ex-relator do Conselho de Ética, Fausto Pinato (PRB-SP); e 10) relato de oferta de propina a Pinatto, ex-relator do processo de Cunha no Conselho de Ética.
Ao acatar os argumentos apresentados pelo MPF, o juiz federal Sergio Moro mencionou também os fundamentos utilizados na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou o afastamento de Eduardo Cunha do cargo, lembrando ainda o empenho do ex-deputado para obstar o seu próprio processo de cassação na Câmara. “Os episódios incluem encerramento indevido de sessões do Conselho de Ética, falta de disponibilização de local para reunião do Conselho e até mesmo ameaça sofrida pelo relator do processo.”, ressaltou o magistrado na decisão. Ainda de acordo com o Judiciário, a cassação não suprimiu os riscos que ensejam a prisão, até porque o ex-deputado agiu por intermédio de terceiros, inclusive agentes que não são parlamentares.
Risco à ordem pública – Ao explicar o risco existente para a instrução dos processos, o juiz da 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba salientou ainda o “caráter serial” dos crimes, o que caracteriza risco à ordem pública. Além da ação penal referente a propinas pagas pela compra do campo de Benin, no momento que teve seu mandato cassado, Eduardo Cunha já respondia a outro processo no STF por corrupção e lavagem de dinheiro em fatos relacionados à aquisição de navios-sonda da Petrobras. O ex-parlamentar federal figura em diversas outras investigações relacionadas a crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, o que indica que a sua liberdade constitui risco à ordem pública, tendo em vista a reiteração delitiva num contexto de corrupção sistêmica.
Risco à aplicação da lei penal – Por fim, a decisão menciona evidências que apontam para a existência de contas no exterior, pertencentes a Eduardo Cunha, e que ainda não foram completamente identificadas e bloqueadas, o que enseja risco à aplicação da lei penal. “Enquanto não houver rastreamento completo do dinheiro e a total identificação de sua localização atual, há um risco de dissipação do produto do crime, o que inviabilizará a sua recuperação. Enquanto não afastado o risco de dissipação do produto do crime, presente igualmente um risco maior de fuga ao exterior, uma vez que o acusado poderia se valer de recursos ilícitos ali mantidos para facilitar fuga e refúgio no exterior”, destacou o juiz na decisão. O risco de fuga é incrementado, ainda, pela dupla nacionalidade de Cunha.
STF não deliberou sobre prisão – O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também requereu ao STF a prisão preventiva de Eduardo Cunha. No entanto, a Suprema Corte não chegou a apreciar o mérito desse pedido pois o requerimento ficou prejudicado com a cassação do mandato. A corroborar a presença dos requisitos da preventiva, o juiz federal mencionou o caso de Lúcio Bolonha Funaro, que agiu sob ordens de do ex-deputado e teve sua prisão cautelar determinada pelo Supremo.
Caso em que a prisão foi decretada – A prisão foi decretada na ação penal em que o ex-presidente da Câmara dos Deputados responde por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas em fatos relacionados à aquisição de um campo exploratório de petróleo em Benin, na África, pela Petrobras, no ano de 2011. De acordo, com o MPF, Eduardo Cunha recebeu US$ 1,5 milhão a título de propina, por intermédio do operador financeiro João Augusto Rezende Henriques, que depositou o valor em uma conta secreta do ex-deputado federal na Suíça. Henriques também se encontra preso preventivamente desde agosto de 2015 e já respondia pelos mesmos fatos perante a 13.ª Vara Federal Criminal desde junho de 2016. Na mesma ação penal foram denunciados Jorge Luiz Zelada, ex-diretor da Petrobras, Idalecio Oliveira, empresário português que era proprietário do campo, e Cláudia Cordeiro Cruz, esposa de Cunha, que é acusada de seu utilizar de uma conta em seu nome para ocultar a existência dos valores.
Bloqueio de valores – A força-tarefa do MPF em Curitiba também promoveu ação de improbidade administrativa em face de Eduardo Cunha e dos demais envolvidos no caso, tendo sido decretada, pelo juízo da 6.ª Vara Federal de Curitiba, a indisponibilidade de bens de Eduardo Cunha no valor de R$ 220.677.515,24 (autos nº 5028568-79.2016.404.7000).