BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) — Relator da CPI da Covid, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) decidiu propor em seu texto final da comissão o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro e de outros dois ministros de seu governo: o titular da Saúde, Marcelo Queiroga, e o atual ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni.
Como havia adiantado em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Renan vai sugerir o indiciamento de Bolsonaro por 11 crimes. Entre eles, por homicídio comissivo por omissão, crime de epidemia, infração de medida sanitária, charlatanismo e crimes de responsabilidade.
O relatório final completo deve ser divulgado na próxima segunda-feira (18). A leitura do texto será feita em sessão da CPI da Covid no dia seguinte, com a votação pelos membros na quarta-feira (20).
Inicialmente, o relator não cogitava responsabilizar Bolsonaro por nenhuma tipificação relacionada a homicídio. No entanto, como afirmou na entrevista à Folha, após reuniões com especialistas, decidiu responsabilizá-lo por homicídio comissivo, quando é cometido por omissão.
O relator da CPI também vai propor o indiciamento do ministro Marcelo Queiroga pelo crime de epidemia. Inicialmente respaldado pelos senadores ao substituir Eduardo Pazuello, os membros da comissão alegam que o atual ocupante da pasta se “converteu ao negacionismo”.
Durante as sessões, citaram como exemplo a suspensão da vacinação de adolescentes e a própria defesa do chamado tratamento precoce em evento da Organização Mundial de Saúde.Um terceiro ministro pode ser incluído na lista de sugestão de indiciados, o atual titular da Defesa, Walter Braga Netto.
Renan quer incluir o general por sua atuação durante o período em que foi ministro da Casa Civil. O militar teria participado, por exemplo, da reunião em que foi sugerida a alteração da bula da hidroxicloroquina.
No entanto a inclusão de Braga Netto não é consenso entre os membros do grupo majoritário, e o general nem chegou a ser convocado para depor perante a comissão.
Por isso Renan pretende usar convencer os demais integrantes do G7 ainda na tarde desta sexta-feira (15). O relator vai manter conversas individuais com outros senadores para apresentar o seu texto preliminar e colher sugestões.
Renan também vai incluir em seu texto a proposta de indiciamento de filhos do presidente Bolsonaro, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). A comissão quer que eles respondam por infração de norma sanitária.
Como mostrou a coluna Painel, da Folha de S.Paulo, o relatório usa informações de 16 depoimentos prestados à Polícia Federal e encaminhados à comissão para indicar Carlos como articulador da rede bolsonarista de distribuição de notícias falsas e desinformação.
Com base nos relatos, a conclusão da apuração também deve apontar o deputado Eduardo Bolsonaro como elo da rede com supostos financiadores, entre eles os empresários Otávio Fakhoury e Luciano Hang.
Renan incluiu em seu relatório o ex-ministro Eduardo Pazuello e o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco.
“Existem figuras principais [no relatório]. O general [Eduardo] Pazuello é um, o coronel Élcio Franco, o presidente da República, tiveram participações comprovadas na materialização do que aconteceu no Brasil e no custo que se pagou com vidas. Esses são os principais, mas vamos ter o indiciamento de mais de 40 pessoas”, havia dito na entrevista.
O senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente da República, divulgou nota na qual afirma que o relatório da CPI “não se sustenta” e “é um desrespeito” com as vítimas da Covid-19 no Brasil. Diz ainda que o documento busca influir nas eleições presidenciais do próximo ano.
“Trata-se apenas de uma peça política para agradar ao PT e para tentar desgastar o presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2022. As acusações contra mim e contra o governo não têm base jurídica e sequer fazem sentido”, afirma o texto da nota.
O parlamentar busca no texto ressaltar a compra e aplicação de vacinas pelo governo federal, a distribuição de oxigênio e o pagamento do auxílio emergencial.
ÚLTIMO DEPOIMENTO
Os senadores da CPI da Covid marcaram para a próxima segunda-feira (18) o depoimento de Nelson Mussolini, representante do Conselho Nacional de Saúde e também membro da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias ao Sistema Único de Saúde), órgão consultivo do Ministério da Saúde.
Os membros do grupo majoritário da CPI querem mais informações sobre a reunião da Conitec na última quarta-feira (7), quando seria avaliado o parece de um estudo contrário aos medicamentos do chamado “Kit Covid”. O assunto saiu de pauta, sem maiores justificativas.
“Quero saber até onde vai ou até onde foi a intervenção política nas decisões dessa instância técnica relativas aos protocolos de enfrentamento da pandemia”, afirmou Randolfe Rodrigues.
Durante sessão da CPI naquele mesmo dia, os senadores apontaram ingerência do Palácio do Planalto na Conitec, por meio do ministro da Saúde Marcelo Queiroga.
O tema teria sido retirado de pauta, alegam, a pedido do presidente Jair Bolsonaro, notório defensor da hidroxicloroquina e outros medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19.
Randolfe chegou a ler trecho do documento que seria discutido na Conitec.
“Sobre cloroquina e hidroxicloroquina, o que diz a Conitec e que deveria ser deliberado hoje neste relatório? ‘Recomendamos não utilizar hidroxicloroquina, cloroquina, isolado ou em associação com azitromicina, em pacientes com suspeita ou diagnóstico de covid-19, em tratamento ambulatorial. Recomendação forte. Certeza da evidência moderada ou ainda de não ter evidência'”, leu o senador.
A decisão sobre o nome do depoente da próxima segunda-feira foi decidida em reunião virtual fechada dos membros da comissão.
Antes, em uma sessão oficial remota, os senadores aprovaram cinco requerimentos de convocação de membros da Conitec que haviam participado da reunião, mas decidiram afunilar em um único depoente durante o encontro reservado.
A ideia inicial dos senadores era ouvir na sessão de segunda-feira (18) o responsável pelo estudo, o médico Carlos Roberto Ribeiro de Carvalho.
No entanto, membros da comissão entraram em contato com o médico e foram informados que ele não estaria disposto a apresentar o estudo e as conclusões perante a CPI. Por isso, de maneira prática, decidiram aprovar a convocação de Carvalho e mais quatro membros da Conitec.
Os senadores também aprovaram na sessão requerimento para a realização de uma audiência pública com familiares de vítimas da Covid-19.
Foram convidados a enfermeira de Manaus Mayra Pires Lima, Katia shirlene Castilhos dos Santos, que perdeu familiares durante a pandemia; Rosane Brandão, que perdeu o companheiro; Jarquivaldo Bites Leite, que foi infectado pelo coronavírus; Antonio Carlos Costa, ONG Rio de paz; e Marco Antonio, também afetado pela pandemia.
O evento com familiares e membros da sociedade civil está marcado para a tarde de segunda-feira.
A decisão de ouvir um representante da Conitec na sessão com o último depoimento marcou uma mudança em relação ao planejamento inicial. Inicialmente, a sessão de segunda-feira (18) estava destinada para o terceiro depoimento do ministro da Saúde Marcelo Queiroga.
Os membros do grupo majoritário queriam ouvir novamente o titular da pasta, pois ele havia se recusado a responder um questionário enviado pela comissão.
Além disso, apontavam que ele havia se “se convertido ao negacionismo”, ao interromper a vacinação contra a Covid-19 de adolescentes e por seu comportamento em Nova York, quando integrava comitiva presidencial, ao fazer gestos obscenos para manifestantes.
No dia seguinte, no entanto, Queiroga convocou uma entrevista coletiva para divulgar detalhes da vacinação contra a Covid-19 em 2022, satisfazendo uma demanda dos senadores.