O grande acúmulo de processos no Supremo – hoje, cerca de 200 mil ações aguardam julgamento – decorre da estrutura do sistema judiciário brasileiro, em que os casos que deveriam se resolver nas instâncias inferiores acabam chegando ao tribunal máximo do país. A avaliação foi apresentada pela presidente em exercício do Supremo, ministra Ellen Gracie, em palestra aos estagiários da Escola do Comando do Estado Maior do Exército (Eceme) e a estagiários da Marinha e da Aeronáutica, na manhã desta terça-feira (25).
Ellen Gracie explicou que o Supremo tem dupla função: a de corte constitucional e a de corte de apelação, quando recebe, pela via do recurso extraordinário, demandas que se iniciaram no primeiro grau. Daí decorre o que ela chamou de deformação do sistema, pois a primeira e segunda instâncias tornaram-se meras “vias de passagem”. “Num sistema judicial saudável, as demandas param no primeiro grau de jurisdição”, afirmou.
Para dar a dimensão do problema, Ellen Gracie comparou o modelo brasileiro ao americano. Nos Estados Unidos, país com população superior à do Brasil e com alto grau de litigiosidade, cerca de 80% das demandas estancam no primeiro grau e, portanto, apenas 20% sobem aos tribunais de Justiça. Enquanto a Suprema Corte Americana recebe cerca de cinco mil processos por ano e seleciona não mais que cem para julgar, o Supremo julga, em média, um número dez vezes maior de ações. No ano passado, por exemplo, Tribunal recebeu 95.212 processos e realizou 103.700 julgamentos, incluindo decisões monocráticas (proferidas pelo ministro-relator) e colegiadas (Turmas e Plenário).
Ellen Gracie destacou que a Emenda Constitucional nº 45/04, que promoveu a reforma do Judiciário, trouxe instrumentos poderosos para a redução da demanda, a exemplo da súmula vinculante e da repercussão geral. “A súmula vinculante tem potencial de eliminar demanda de massa, repetitiva”, argumentou, explicando que esse é um mecanismo pelo qual a solução que é dada a um caso deve ser aplicada aos demais semelhantes, mas sempre em relação a questões absolutamente homogêneas. Um exemplo seriam decisões sobre temas previdenciários, como a definição do reajuste de um benefício relativo a determinado período. No entanto, até agora o Supremo não aprovou nenhuma súmula desse tipo.
No caso da repercussão geral, a Emenda 45 dispõe que, no recurso extraordinário que chega ao Supremo, o recorrente deve demonstrar que o caso envolve questões que não se limitam às partes, mas, sim, repercutem em toda a sociedade. Só esses casos, então, seriam aceitos pelo Tribunal. O instituto, no entanto, ainda deve ser regulamentado por lei.
CNJ
Outra inovação trazida pela Emenda 45, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foi apontado pela ministra como mais um importante instrumento para a melhoria do sistema. “O CNJ deu ao Judiciário o que ele não tinha: estratégia”, revelou. Ellen Gracie, que também é presidente do CNJ, explicou que a instituição é voltada para o planejamento do Judiciário, não interferindo em questões jurisdicionais, apenas nas administrativas. “O juiz tem de ser independente para julgar”, lembrou.
Justiça Eleitoral
A Justiça Eleitoral brasileira é “um cartão de visitas” na opinião de Ellen Gracie. “O fato de termos 120 milhões de eleitores e obtermos o resultado de eleições presidenciais em apenas cinco horas é um exemplo para o mundo”, orgulha-se. Para a ministra, é preciso reproduzir esse padrão de eficiência nos demais ramos da Justiça brasileira.
TV Justiça
Como um dos pontos positivos do Judiciário, Ellen Gracie ressaltou a transparência, já que, por determinação constitucional, todos os julgamentos são públicos e as decisões, fundamentadas – o que não ocorre em todos os países. Uma particularidade brasileira é a transmissão ao vivo, desde agosto de 2002, das sessões plenárias do Supremo pela TV Justiça.“Não há, no mundo inteiro, nenhuma corte suprema que delibere em televisão”, disse.
Fonte: STF