Medicamentos utilizados no tratamento de pacientes com câncer de próstata, em estágio avançado, poderão ter um novo destino e função no Brasil: a castração química de pedófilos. A nova utilidade dos fármacos depende, agora, da aprovação do Senado, que deve receber da Câmara de Deputados o projeto de lei aprovado na quinta-feira (12) que dispõe sobre o assunto.
Conforme a emenda do Projeto de Lei nº 3.976/2020, o uso de medicamentos inibidores da libido passará a fazer parte das penas já previstas para pessoas condenadas por crimes sexuais contra menores de idade. O documento não determina o fármaco, apenas que a aplicação será realizada nos termos regulamentados pelo Ministério da Saúde.
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Como funciona a castração química
Entre as opções presentes no mercado, existem dois tipos de inibidores centrais da liberação de testosterona que são injetáveis: os agonistas LHRH e os antagonistas de LHRH.
— Ambos alteram a liberação na hipófise do hormônio, que é o que faz o testículo trabalhar para produzir a testosterona, e, com isso, a testosterona cai a níveis de castração, próximos de retirar os testículos. É como se tu retirasse os testículos, só que de forma química e não de forma cirúrgica. Esse tratamento é utilizado para câncer de próstata — explica o médico Ricardo Zordan, urologista titular da Sociedade Brasileira de Urologia e pesquisador em câncer de próstata no Proadi-SUS Hospital Moinhos de Vento.
A castração química é reversível e para mantê-la os medicamentos precisam ser reaplicados regularmente. As injeções, que podem ser aplicadas em qualquer região do corpo, criam uma espécie de depósito que vai sendo absorvido aos poucos pelo organismo. Atualmente, existem no mercado opções com duração mensal e trimestral e os valores podem variar de R$ 900 a R$ 2,8 mil.
Conforme o chefe do Serviço de Urologia da Santa Casa de Porto Alegre, Ernani Rhoden, a redução parcial ou total da testosterona no organismo afeta negativamente todas as funções sexuais masculinas.
— O medicamento atua em todas as fases do ciclo sexual masculino, que é libido, ereção, ejaculação e orgasmo. Mas a principal função sexual acessada pela castração é a libido, é o desejo, ou seja, diminui o interesse do homem pela busca da interação sexual — detalha Rhoden.
Zordan complementa que, como consequência, o bloqueio do desejo sexual faz com que o indivíduo não tenha ereção. Além disso, traz efeitos colaterais similares aos da menopausa, como sensação de calor, dor nas mamas, perda de massa muscular e óssea entre outras.
— Tu transforma o indivíduo como se ele tivesse câncer de próstata e fosse um paciente fazendo um tratamento. Só que a doença não é câncer de próstata, a doença é a perversão sexual — comenta o médico pesquisador em câncer de próstata.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a pedofilia como um transtorno da preferência sexual, descrevendo pedófilos como adultos com preferência sexual por crianças, geralmente pré-púberes ou no início da puberdade.
A medida aprovada pelos deputados é adotada em países como os Estados Unidos, Polônia, Estônia e Rússia.
Castração química pelo mundo
EUA
A Califórnia foi o primeiro Estado a aprovar o tratamento químico hormonal para criminosos sexuais, em 1996. A Flórida, Geórgia, Iowa, Luisiana, Montana, Oregon, Texas e Wisconsin também aderiram ao procedimento.
Polônia
Em 2009, o parlamento polonês aprovou uma emenda ao Código Penal para incluir a castração química para molestadores de crianças.
Moldávia
A medida foi aprovada de forma obrigatória para estupradores juvenis em 2012.
Estônia
Em 2012, o país aprovou a castração química obrigatória para pessoas condenadas por abuso sexual de menores. Conforme a lei do país, são os tribunais que devem impor esse “tratamento” por um período máximo de três anos.
Rússia
Em 4 de outubro de 2011, o parlamento da Rússia aprovou uma lei contra a pedofilia declarando que as pessoas que cometeram crimes sexuais contra crianças menores de 14 anos seriam submetidas à castração química e reincidentes à prisão perpétua.
Indonésia, Paquistão, República Tcheca e Canadá também são exemplos de locais que adotam a castração química.
O caso Alan Turing
O cientista e matemático britânico Alan Turing (1912-1954), que ajudou os aliados a vencer a 2ª Guerra Mundial ao decifrar o código secreto nazista, foi punido, aos 39 anos, com a castração química por manter relações com pessoas do mesmo sexo. A homossexualidade era considerada um crime na Inglaterra — e só deixou de ser ilegal em 1967. Turing morreu em 1954.
Alan Turing desenvolveu, aos 24 anos, um modelo computacional teórico, chamado hoje de Máquina de Turing, que contribuiu para os fundamentos da computação moderna.
Por Zero Hora