A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no Conflito de Competência nº. 164.544/MG definiu que a Justiça Comum é competente para análise e julgamento de feitos envolvendo motoristas de aplicativos de transporte privado, pela inexistência de relação de emprego e, por consequência, compreendeu pela ausência de vínculo trabalhista entre o motorista e a empresa detentora do aplicativo.
Entenda o caso: o motorista ajuizou, perante um Juizado Especial Cível, ação de obrigação de fazer cominada com reparação por danos materiais e morais em face de pessoa jurídica de direito privado, detentora de aplicativo, sob a alegação de que a sua conta havia sido suspensa, com a justificativa da empresa de comportamento irregular e mau uso do aplicativo, impossibilitando-o de exercer as atividades como motorista, provocando, em tese, prejuízos materiais por ter locado um veículo para a realização do serviço, pleiteando, dessa maneira, a reativação da conta no aplicativo e o ressarcimento pelos danos materiais e morais. O JEC declinou da sua competência, entendendo que se tratava de relação de trabalho, os autos foram remetidos para o juízo laboral, o qual declarou-se igualmente incompetente, suscitando o conflito de competência.
O CC foi relatado pelo Ministro Moura Ribeiro, que externou entendimento de acordo com o qual a natureza jurídica da pretensão do motorista de aplicativo não se associa a eventual relação de emprego, tampouco ao recebimento de verbas de natureza trabalhista, mas de contrato de intermediação digital para prestação de serviços firmado com empresa detentora de aplicativo, de cunho civil, no qual os motoristas, executores da atividade, atuam como empreendedores individuais, sem vínculo de emprego com a empresa proprietária da plataforma, sendo, por isso, a Justiça Comum Estadual competente para julgar os feitos envolvendo motoristas de aplicativo e as empresas detentoras da solução tecnológica.
O Ministro Moura Ribeiro entendeu ainda que os motoristas de aplicativo não mantém relação hierárquica com a empresa detentora do aplicativo, “porque seus serviços são prestados de forma eventual, sem horários pré-estabelecidos e não recebem salário fixo, o que descaracteriza o vínculo empregatício”, tendo em vista que afastado algum dos pressupostos da relação de emprego, o trabalho é caracterizado como autônomo ou eventual. Esclareceu-se, por isso, que essas ferramentas tecnológicas se enquadram no paradigma de economia compartilhada, na qual o transporte remunerado privado individual de passageiros (art. 4º, X, Lei nº. 12.587/2012) é uma atividade de caráter privado para o compartilhamento de bens entre pessoas, através de sistema informatizado em um mercado entre pares.
Wilson Sales Belchior – É graduado em direito pela UNIFOR, especialista em Processo Civil pela UECE, MBA em Gestão Empresarial e mestre em Direito e Gestão de Conflitos na UNIFOR. Também possui curso de curta duração em resolução de conflitos na Columbia Law School, nos Estados Unidos. Na mesma instituição participou de série de pesquisa avançada. Palestrante, professor universitário em cursos de pós-graduação em diferentes estados e autor de diversos artigos e livros, publicados em revistas, jornais, portais de notícias e editoras de circulação nacional. Conselheiro Federal da OAB (2013-2015). Vice-presidente da Comissão Nacional de Advocacia Corporativa do Conselho Federal da OAB (2013-2015). Membro da Comissão Nacional de Sociedade de Advogados do Conselho Federal da OAB (2010-2012). Membro da Coordenação de Inteligência Artificial do CFOAB (2018). Atualmente é Conselheiro Federal eleito para o triênio 2019-2021 e Presidente da Comissão Nacional de Direito Bancário.