A 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) no julgamento da Apelação 1044455-44.2018.8.26.0053 fixou entendimento de que o serviço de carona solidária não se confunde com a carona paga (transporte remunerado privado individual de passageiros), tampouco com o transporte intermunicipal de passageiros, porquanto existe tão somente a divisão de custos da viagem, sem intenção de lucro, esclarecendo-se, igualmente, que a cobrança de assinatura dos usuários refere-se à remuneração pelo uso do sistema e não cobrança de passagem.
No caso concreto, uma empresa de ônibus interpôs apelação em face de sentença que julgou improcedente a ação de rito comum ajuizada contra uma pessoa jurídica que detém aplicativo de carona solidária e a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), argumentando, no mérito, que o objetivo da insurreição consistiu que a empresa detentora do aplicativo impedisse que fossem oferecidas, em sua plataforma digital, caronas com valor superior ao compartilhamento de custos, nos trajetos em que a apelante tem a outorga do serviço de transporte público intermunicipal, para que, segundo a empresa de ônibus, seja evitada a concorrência desleal, acrescentando que a Artesp possui o dever de fiscalização quanto à regulamentação do transporte intermunicipal, visto que o aplicativo propiciaria, de acordo com a apelante, transporte irregular de passageiros, com obtenção de lucro.
O relator, Desembargador Vicente de Abreu Amadei, em seu voto, explicou que o surgimento de aplicativos de carona solidária se enquadram no contexto da economia do compartilhamento, devendo ser fixada diferença entre esse tipo de transporte no qual existe apenas a divisão de custos da viagem e o transporte remunerado privado individual de passageiros, regulamentado com as alterações trazidas ao ordenamento jurídico pela Lei nº 13.640/2018, em que existe a finalidade lucrativa. Nesse sentido, o Desembargador relator afastou a hipótese de concorrência desleal sustentando que “não é possível comparar a atividade prestada por meio da plataforma […] com a atividade de transporte intermunicipal de passageiros realizada pela autora [da ação]. Não sendo possível a comparação entre ambas, não há como se cogitar de concorrência desleal, pois nem mesmo concorrência há”.
Para negar-se provimento à apelação da empresa de ônibus também se entendeu que no caso concreto não existe contrato de transporte, porquanto não há lucro no aplicativo de carona solidária, diferentemente do que acontece com os serviços prestados por empresa de ônibus intermunicipal, reafirmando-se que o objetivo desse tipo de aplicativo é “tão somente a divisão dos custos das viagens de longa distância”, não estando sujeita, por isso, aos princípios constantes da Lei de Mobilidade Urbana.
Wilson Sales Belchior – Advogado e graduado em direito pela UNIFOR, especialista em Processo Civil pela UECE, MBA em Gestão Empresarial e mestre em Direito e Gestão de Conflitos na UNIFOR. Também possui curso de curta duração em resolução de conflitos na Columbia Law School, nos Estados Unidos. Na mesma instituição participou de série de pesquisa avançada. Palestrante, professor universitário em cursos de pós-graduação em diferentes estados e autor de diversos artigos e livros, publicados em revistas, jornais, portais de notícias e editoras de circulação nacional. Conselheiro Federal da OAB (2013-2015). Vice-presidente da Comissão Nacional de Advocacia Corporativa do Conselho Federal da OAB (2013-2015). Membro da Comissão Nacional de Sociedade de Advogados do Conselho Federal da OAB (2010-2012). Membro da Coordenação de Inteligência Artificial do CFOAB (2018). Atualmente é Conselheiro Federal eleito para o triênio 2019-2021 e Presidente da Comissão Nacional de Direito Bancário.