Na madrugada de 13 de março de 1964, a americana Kitty Genovese foi esfaqueada e estupra da quando chegava a sua casa, no bairro do Queens, em Nova York. Os desesperados gritos por socorro foram ouvidos, conforme demonstrou a investigação policial, por 38 pessoas, moradoras de apartamentos próximos. A maioria chegou até a janela, viu o ataque e voltou para cama. Apenas uma testemunha gritou de sua janela para o agressor deixar a mulher em paz. Entre todos, só uma mulher ligou para a polícia. Kitty Genovese morreu a caminho do hospital. Ela tinha 29 anos.
O repórter do “New York Times” Martin Gansberg percebeu a dimensão da notícia, que saiu na primeira página. O foco da matéria era a quantidade de testemunhas que ignoraram o sofrimento da vítima e nada fizeram.
A notícia foi replicada por todo o mundo, e estudiosos do comportamento debruçaram-se sobre o evento, criando o termo “efeito espectador” ou “efeito Genovese”, que nada mais é do que a apatia vigente na sociedade diante do sofrimento do outro, a total falta de coragem em agir, a covardia.
Por incrível que pareça, o “efeito espectador” não é observado entre os animais, como demonstra a etologia, a ciência que estuda o comportamento animal. Só o homem mostra-se indiferente ao sofrimento do seu semelhante. Foi assim recentemente com um médico atacado na Lagoa quando pedalava sua bicicleta. Ele foi esfaqueado por assaltantes mirins e morreu. Ninguém perseguiu os agressores ou tentou defendê-lo.
Um policial militar foi torturado, morto, teve seu corpo preso por uma corda a um cavalo e foi arrastado pela favela por traficantes. A selvageria típica da Idade Média pouco impactou a sociedade. Ólogos e ólogas, aguerridos defensores de direitos dos excluídos, nada falaram. Nem uma única palavra.
O grande problema não está nessa indiferença. O grande problema vai existir quando aqueles que escolheram colocar suas vidas em defesa da sociedade também agirem com o “efeito espectador”. Não está longe tal dia, pois o que se ouve nas corporações policiais é: quero para a sociedade o mesmo que ela deseja para mim. Ou seja, que ela se dane.
O texto acima é de Aurílio Nascimento, do Jornal Extra e retrata a nossa realidade. Quanto maior o número de espectadores, menos provável será que qualquer um deles vá ajudar.