Brasil

Brega ou Chique? Eis a questão

Definição de ambos os termos depende da cultura e, sobretudo, do gosto que cada pessoa tem

Quem nunca ouviu alguém dizer que fulano está brega ou chique demais? Pois é, esses termos já foram tão usados que hoje em dia, eles se entrelaçam e acabam se confundindo. É certo que a definição de ambos, depende da cultura e, sobretudo, do gosto que cada pessoa tem. Ninguém consegue ser totalmente uma coisa ou outra, e às vezes, a pessoa se esforça tanto em ser chique, que a única coisa que consegue é ser brega. Mas é justamente isso: ninguém está livre do rótulo brega.

A origem da palavra brega ainda é muito discutida, alguns dizem que surgiu de uma placa de uma das ruas do Pelourinho em Salvador, que se chamava Pe. Manuel da Nóbrega, com o desgaste da placa restou apenas o final da palavra, ou seja, brega. A partir daí, tudo que os moradores consideravam de pouco valor ou ultrapassado, atribuía àquela rua. Mas desde o começo dos anos 80, essa palavra vem sendo usada para designar a música de mau gosto, geralmente feita para as camadas populares, com exageros de dramaticidade ou letras de uma insuportável ingenuidade. Também já disseram que brega era gíria de empregada doméstica e posteriormente, músicas que elas gostavam. No entanto, a definição mais aceita é que a palavra era destinada aos prostíbulos.

Se a definição de brega é difícil, a de chique torna-se ainda mais complicada. De acordo com o dicionário Aurélio, significa “elegante no trajar”, porém não é sempre isso que acontece. O chique já virou brega e o brega virou chique. Por exemplo, sandália Havaiana, já foi o cúmulo da breguice, hoje brega, é quem não usa. As sandálias calçam os pés de pessoas de diferentes classes sociais.

O termo até já deu nome a uma novela da Rede Globo no ano de 1987, a qual fez muito sucesso. E como no Brasil, tudo que passa na televisão vira moda, os telespectadores “imitaram” seus personagens, alguém saberia dizer se a atitude é brega ou chique? Coreografias de bandas de axé music introduziram uma verdadeira onda no Brasil, e dividiram opiniões, pois alguns teimavam em encaixar as coreografias no estilo brega.

Vários nomes da música brasileira se renderam ao estilo brega, como por exemplo, Reginaldo Rossi (considerado o Rei do Brega), Falcão, Agnaldo Rayol, Wando e Odair José, sem contar as inúmeras bandas de forró que surgem diariamente para contribuir com o avanço desse estilo.

Aliás, o estilo brega assumido começa no figurino do artista, um painel tropicalista de cores e descombinações. Um exemplo é o cantor Falcão que em suas músicas, mistura português com inglês, “My little coffer of love”, inclusive um inglês intencionalmente macarrônico, em descarada gozação com a mania colonizada de se usar a língua oficial do FMI para tudo. Falcão usa com inteligência a sátira e o deboche com o objetivo do humor. Nesse sentido, o seu trabalho – melhor dizendo, as suas piadas musicais -, embora feito para divertir, têm um recorte crítico interessante. Afinal, a função do humor é essa mesma: desmontar pelo riso os chamados grandes assuntos e grandes temas, aquilo que se leva a sério demais. Falcão parece não se levar muito a sério, o que é ótimo. Ele é uma das figuras bregas do País.

É difícil acreditar, mas existe “patricinha” que são fãs de Amado Batista, ou seja, o brega virou coisa de elite. Algumas pessoas acham que é possível ser brega sem perder a posse, sem deixar de ser chique.

Nos anos 70 e 80, quando aparecia um artista com um trabalho popular, de canção brasileira, eclético, e que ainda por cima não fosse pertencente a nenhum grupinho ou panelinha, virava brega. Se hoje, no rol dos inclassificáveis, encontramos gente como Paulinho Moska e Ana Carolina (que já foram chamados de bregas por causa de momentos mais românticos de suas obras), nos anos 70/80, eles se proliferavam. O cantor niteroiense Dalto, por exemplo, teve seu primeiro hit single em 1974 com Flash Back e foi logo colocado nesse meio. Quando a soul music surgiu no Brasil, artistas como Hyldon e Cassiano foram parar nesse meio com rapidez – por trás de tudo estavam os eternos Robson Jorge e Lincoln Olivetti, que também foram responsáveis pelas carreiras de Claudia Telles e Ronaldo Resedá, one-hit wonders da época.

Brilhante no brega é que ele representa não um complexo de inferioridade do povo brasileiro, e sim a sua sensação de superioridade. Os adeptos desse estilo buscam fazer sempre o melhor e dizem que o brega não é incompetência e sim, orgulho de mostrar o que realmente é.

E nesse país, brega só tem vez quando vira “cult” ou quando é motivo para se fazer humor. E as duas formas de se ver podem ter sentido pejorativo, pois batizar algo de “cult” pode ser um jeito de descaracterizar, ou de “desperceber” uma forma de expressão. Afinal, gostar de ser “cult” parece ter a única intenção de se mostrar que se é uma pessoa “antenada”, “original”.

Em compensação tem umas coisas que são bregas, mas têm lá sua simpatia e poderia-se até dizer que são imprescindíveis mesmo. Veja o caso daqueles calendários de borracharia. Imagina uma borracharia sem calendário de mulher pelada? Inviável. Pode ir logo desacreditando da seriedade da firma. Mas é assim mesmo, faz parte do universo dos pneus e câmeras de ar.

Certos termos mudaram apenas de roupa, mas foi o suficiente pra escapar da breguice. Calção de praia virou sunga. Keds virou tênis. Eletrola virou vitrola que virou radiola que virou toca-disco que não virou nada porque chegou o cd player pra acabar com a festa. E não acabou por aí, o CD deu lugar para o mp3 player, aparelho que comporta um alto número de músicas compactadas. Os tempos estão mesmo estranhos. São tempos em que conceitos como brega e chique se invadem sem cerimônia e tudo se torna indefinível.


Valéria Sinésio
ClickPB

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