Pelo menos 200 mil usuários de telefonia celular, usando estimativas conservadoras, foram prejudicados desde a tarde dessa sexta-feira pelo desligamento das antenas próximas de seis presídios de São Paulo, como determinado pela Justiça. Isso equivale à metade das pessoas que têm aparelhos nessas áreas, conforme dados divulgados pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
O número de prejudicados com a medida, da consultoria Telequest, não leva em conta os que passam pelas rodovias próximas das prisões. Em caso de emergência, como carro quebrado, as pessoas terão de sair à procura do telefone fixo. A medida vale por 20 dias.
Em Araraquara, Iaras, São Vicente, Franco da Rocha e Presidente Venceslau, o corte ocorreu à tarde, a partir das 13 horas. Em São Vicente, já havia problemas de sinal perto dos presídios na parte da manhã. A solução de emergência encontrada pelas operadoras foi desligar ou redirecionar antenas.
Além de trazer transtornos à população, as antenas desligadas não garantem o fim da comunicação dos presos. Quando se desliga o sinal forte de uma antena próxima, existem aparelhos que conseguem captar sinais mais fracos de equipamentos em torres mais distantes. O uso de bloqueadores traria menos prejuízo à população.
Técnicos da Anatel calculam que custará R$ 1 milhão o bloqueio do uso de telefones móveis em cada uma das 144 unidades prisionais de São Paulo quando o governo editar um instrumento legal determinado a medida. Segundo a newsletter Tele.Síntese Análise, o custo será alto, pois há necessidade de bloquear nove faixas de freqüência. O governo admitiu que prepara um decreto ou uma medida provisória com determinações para impedir a comunicação dos detentos. Mas não há prazo para divulgação dessas medidas.
Além das operadoras de telefonia móvel, o bloqueador teria de agir sobre o serviço de rádio, como o da Nextel, sobre o telefone móvel por satélite e sobre as redes sem fio de comunicação de dados. A manutenção anual sairia por 10% do valor de instalação. O bloqueio determinado pela Justiça não impede outros tipos de comunicação, que operam em radiofreqüência diferente da usada pelos celulares. A Anatel admite que, mesmo agora, não se pode dizer que a comunicação das facções criminosas com as ruas esteja “100% paralisada”.
População indignada
Moradores de Presidente Venceslau, que recebeu os 765 presos ligados ao comando do Primeiro Comando da Capital (PCC), confinados há uma semana na Penitenciária 2, estão indignados com o desligamento das antenas de celulares próximas aos dois presídios da cidade.
O prefeito de Presidente Venceslau, Ângelo César Malacrida (PT), não se conforma com a situação e promete ir à Justiça para devolver aos moradores o direito de usar o telefone celular. O sindicalista Eri Lima não aceita a determinação do Tribunal de Justiça de São Paulo. “Mas há de haver um caminho, porque não podemos permanecer privados desse direito, por conta de o Estado não ser capaz de impedir celulares nos presídios.” A cidade tem cerca de 40 mil habitantes. Estima-se que, de cada dois moradores, um tenha celular.
Araraquara
Em Araraquara, a reação de moradores e donos de pequenas empresas nos arredores da penitenciária também foi de indignação. Eles ficaram sem sinal de celular no início da tarde. A determinação de desativar as antenas foi cumprida pelas operadoras logo após as 13 horas. Um raio de 2 a 3 quilômetros no entorno do presídio ficou sem sinal. “Não deveriam deixar entrar celular na penitenciária em vez de prejudicar as pessoas que moram e trabalham nas proximidades”, disse o autônomo Émerson Berto, de 26 anos, que faz montagem de móveis em bairros atingidos pelo bloqueio. Para Edson Pereira da Silva, de 31, dono de uma oficina de motocicletas, o celular é uma ferramenta de trabalho. “Faço socorro para consertar motos e hoje o telefone ficou mudo.”
Já os moradores de Avaré ficaram confusos com a medida. Por volta das 14h30, alguns celulares começaram a falhar perto da Penitenciária 1, que fica na área urbana. Os aparelhos pré-pagos deixaram de funcionar, mas os pós-pagos estavam fazendo e recebendo ligações. Duas horas mais tarde, apenas celulares da operadora Claro estavam funcionando em ruas próximas. “Está tudo bagunçado”, disse o chefe de gabinete da prefeitura, Celso Ferreira. “Vamos esperar até amanhã para ver se as operadoras colocam fim nessa anarquia”, disse. Funcionários da Penitenciária 2, que fica no bairro Barra Grande, na zona rural, também confirmaram o bloqueio.
Em Iaras, funcionários da empreiteira Injetal, que trabalham no único presídio da cidade, confirmaram o corte no sinal. O município, de 3.500 habitantes, foi afetado parcialmente. O prefeito Paulo Sérgio de Moraes (PTB) continuava usando o celular às 17h30. “Não recebi reclamações”, disse. O aparelho do vereador Valter Augusto Rabelo de Oliveira (PTB) estava sem sinal. O bloqueio do presídio de Iaras afetou também moradores de Águas de Santa Bárbara, estância turística vizinha. Moradores da região leste estavam sem sinal no fim da tarde.
São Vicente
Antes mesmo do horário previsto, pelo menos duas operadoras suspenderam de manhã o sinal das antenas próximas aos três presídios de São Vicente. Inconformada, a população protestou contra a medida. O motorista Jorge Antonio Oliveira Santos mora em Humaitá, a mais de 2 quilômetros de distância das Penitenciárias 1 e 2 e do Centro de Detenção Provisória (CDP), localizados no km 66 da Rodovia Padre Manuel da Nóbrega. Ele ficou indignado com o corte de sinal. Embora as autoridades tivessem garantido que o bloqueio não prejudicaria a população dos bairros próximos, não foi o que aconteceu. “Não podemos aceitar o bloqueio dos nossos celulares, por pura incompetência das autoridades”, reclamou Santos, lembrando que, se os aparelhos entram nas cadeias, é porque alguém permitiu.
Cercada por unidades prisionais e dificuldades econômicas, Franco da Rocha encarou a estréia do bloqueio de sinal para celulares como mais uma limitação. O município, com 140 mil habitantes e considerado um dos mais pobres da região metropolitana, sofreu com o bloqueio nas imediações de cinco presídios, que abrigam 5.732 detentos: as Penitenciárias 1, 2, 3, o Centro de Detenção Provisória e o Centro de Progressão Penitenciária.
De tarde, moradores e comerciantes ficaram sem comunicação por celular. Outros tiveram problemas como demora para completar ligações e falhas de sinal. O prefeito Márcio Cecchetini (PSDB) estuda entrar na Justiça e pedir recursos ao governador Cláudio Lembo (PFL). “O celular é ferramenta e gera negócios”, diz Célio Campos, assessor da prefeitura. Donos de uma pizzaria, Rodrigo Hernandez, de 29 anos, e Karina Pietrobom, de 30, ficaram com os celulares mudos. Eles prevêem queda de 30% no faturamento. “Muitos pedidos de entrega são feitos por celular”, diz Hernandes. Juan Alonso, de 28, dono de uma padaria perto da P1 e P2, considera a medida uma questão de segurança. “Se é uma escolha, fico com a segurança. Há alguns anos, nem sabíamos o que era um celular e vivíamos bem”.
Estadão.com.br
Bloqueio de celulares perto de presídios prejudica 200 mil
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